artigo recomendado

Bolognesi, B., Ribeiro, E., & Codato, A.. (2023). A New Ideological Classification of Brazilian Political Parties. Dados, 66(2), e20210164. Just as democratic politics changes, so does the perception about the parties out of which it is composed. This paper’s main purpose is to provide a new and updated ideological classification of Brazilian political parties. To do so, we applied a survey to political scientists in 2018, asking them to position each party on a left-right continuum and, additionally, to indicate their major goal: to pursue votes, government offices, or policy issues. Our findings indicate a centrifugal force acting upon the party system, pushing most parties to the right. Furthermore, we show a prevalence of patronage and clientelistic parties, which emphasize votes and offices rather than policy. keywords: political parties; political ideology; survey; party models; elections

27 de setembro de 2009

Elites universitárias no campo da Ciência Política brasileira: uma análise da produção acadêmica dos principais periódicos da área (1989-2008)

[Air Force Heavy Press,
1952. Al Fenn. Life]


paper a ser apresentado

na reunião da Anpocs, 2009


Fernando Baptista Leite (UFPR),
Adriano Codato (UFPR)

O paper apresenta e discute o método utilizado para analisar a produção acadêmica da área de Ciência Política entre 2004 e 2008.

Nosso principal objetivo é tornar público esse método, para que sirva de referência para outros pesquisadores e para depurá-lo a partir do escrutínio coletivo.

O trabalho é composto da seguinte forma:

(i) defendemos a necessidade do estudo científico, de preferência sociológico, da ciência política e das ciências sociais em geral, indicando como referência vários trabalhos de cientistas políticos americanos sobre a Ciência Política nos Estados Unidos e no mundo;

(ii) apresentamos os elementos fundamentais – premissas, objeto, problema e escopo – da pesquisa sobre a Ciência Política brasileira contemporânea que conduzimos na Universidade Federal do Paraná; e

(iii) expomos e discutimos o método que adotamos para analisar a produção acadêmica da Ciência Política brasileira contemporânea.

Essa exposição está focada numa discussão a respeito da definição dos periódicos a serem utilizados como representantes da produção acadêmica hegemônica; da eficácia dos indicadores escolhidos para identificarmos a hierarquia cultural e institucional do campo e numa descrição do procedimento de análise dos periódicos.

Quanto à questão da eficácia dos indicadores, tratamos especialmente do Sistema Qualis: seria um indicador seguro para se tomar como critério de escolha de periódicos e como critério para medir a importância de periódicos e instituições acadêmicas? Nós pretendemos mostrar que sim.

para ler o paper completo,
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[resumo expandido aqui]
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24 de setembro de 2009

a Sociologia como ciência da sociedade


[Estação da Luz, 1981.
Antonio Carlos D'Ávila.
Col. Pirelli/MASP]



A Sociologia é um ofício que se recusa a ver o universo social tal como ele se apresenta diante de nós: definitivo e imutável.

O senso comum, aquela visão herdada e reiterada sobre o mundo social, quer fazer crer que as coisas são como são, isto é: que as desigualdades são naturais, nosso modo de vida é universal, nossa forma de organização social é superior, nossos valores específicos são aplicáveis a tudo ou a quase tudo que existe, as hierarquias são necessárias para que as coisas funcionem, as diferenças culturais nunca são bem-vindas e o poder é legítimo por que é, afinal, o poder estabelecido.

O sociólogo, a fim de pôr em devida perspectiva essas miragens arrogantes, deve ser capaz de superar ao menos duas coisas: o conformismo intelectual – para buscar as causas, as conexões entre as causas e o sentido oculto dos processos e instituições sociais, tornando-os compreensíveis a todos; e seu assombro moral diante dos fatos mais esquisitos, longínquos ou excêntricos, principalmente quando elas estão em desacordo com os seus valores e ideais. É preciso compreender, ao invés de julgar.

Assim, o propósito das Ciências Sociais é procurar dizer como o mundo social é, e não como ele deveria ser. Nesse sentido, a Sociologia não é uma terapia coletiva, que pretende curar a sociedade dos seus males, nem uma engenharia social, que deseja reorganizá-la de um modo mais racional, eficaz ou justo.

Há uma confusão em torno das Ciências Sociais, muitas vezes alimentada e difundida pelos próprios cientistas sociais: a Sociologia teria uma missão, que é, imodestamente, a de consertar o mundo. De acordo com esse entendimento, mais comum e mais persistente do que se imagina, a disciplina seria uma espécie de introdução à discussão sobre os “problemas sociais”. Daí se seguiria, quase que automaticamente, uma tomada de consciência coletiva da desigualdade e da injustiça existentes no mundo. Cumprida essas etapas, deveríamos passar à assistência social (ou, nas visões mais radicais, à revolução social).

A Sociologia, ao contrário, é uma atividade intelectual, não uma atitude moral; é uma disposição crítica, não uma ideologia política. É, acima de tudo, um ponto de vista privilegiado, capaz de examinar e considerar minuciosamente tanto um conjunto de valores quanto um costume, tanto um comportamento quanto uma instituição social ou política, restituindo a eles sua verdade histórica e seu sentido social.

Essa atividade tem um traço específico e é isso o que caracteriza o empreendimento sociológico. A Sociologia, afirmou Émile Durkheim, deve ser capaz de explicar o social pelo social.

Isso não é uma redundância. Significa, em outras palavras, que a cultura, os valores, os costumes, a tradição, os comportamentos, os procedimentos e as instituições devem ser entendidos a partir de suas causas (ou funções) sociais, e não em razão de motivos psicológicos, morais, religiosos, políticos, ideológicos, econômicos, etc. Na realidade, é a psicologia, a moralidade, a religião, a política, a ideologia e a economia que devem ser explicadas pela Sociologia – isto é, pelas condições sociais que as tornam possíveis ou necessárias. Cabe à ciência social, por exemplo, observar à psicanálise que Freud esqueceu-se de uma verdade fundamental, que Édipo era um rei, como enfatizou Pierre Bourdieu. Ou seja, a analogia derivada do mito e sua potência explicativa e curativa dependem antes de tudo do reconhecimento das determinações sociais dos comportamentos individuais.

A introjeção desse modo peculiar de ver e dizer o mundo social exige, como qualquer outra habilidade, treino e técnica. A inclusão da Sociologia nos currículos do ensino médio é a oportunidade para exercitar essa prática desde cedo. A aprendizagem dos conceitos e das teorias sociais é, por sua vez, o pré-requisito indispensável para a aquisição desse método de análise.

Adriano Codato

[Este texto foi escrito como introdução
ao projeto pedagógico da disciplina Sociologia
do colégio Positivo; set. 2009]

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21 de setembro de 2009

sobre o papel do indivíduo na história

[Lewis Hine]




Mais!
Folha de S. Paulo
20 set. 2009

"Um por todos"

JORGE COLI

No Mais! de domingo passado, Boris Fausto lembrou a importância das biografias. Elas foram desconsideradas por estudiosos convencidos de que a história é fundada apenas em grandes movimentos coletivos, com razões e agentes ultrapassando de muito as individualidades.
Ora, o gênero biográfico permite que o historiador se infiltre na cultura de uma época, nos comportamentos sociais amplos, e os ilumine, por assim dizer, de dentro.
Marcados pelas inflexões que os formaram, profissionais da história valorizaram as determinantes teóricas, que tendem, sobretudo nos incautos, a levar as análises para uma forte abstração. A biografia é um antídoto contra esses raciocínios menos concretos, mais mecânicos e esquemáticos.

Como os universitários, de modo geral, desdenharam a biografia, certos jornalistas dedicaram-se a ela. Com espírito rigoroso, com inteligência, com o faro que a profissão refinou, produziram obras de referência. É o caso de Fernando Morais. "Olga" e "Chatô - O Rei do Brasil" são livros necessários para compreender tantos aspectos do que ocorreu no Brasil durante largos períodos do século 20.

Uma coisa, porém, é reconsiderar o valor da biografia, que os historiadores verdadeiramente grandes sempre souberam, e pensá-la como digno meio para o conhecimento.
Outra é acreditar que alguns indivíduos devem ser estudados porque suas ações foram determinantes para os caminhos da humanidade.

Considerar que uma única pessoa possa alterar o curso da história é o velho mito do nariz de Cleópatra. Nariguda, seria menos sedutora; Marco Antônio e Júlio César não se apaixonariam. Os destinos de Roma, do Egito e do Ocidente teriam sido outros.
Que um nariz possa ser responsável por tanta coisa é implausível. A história séria não pode dar valor a uma frivolidade assim. Mas o caso é que ela reduz também todas as ações pessoais à irrelevância do nariz.

Daí os ataques que sofreu Paul Veyne, grande especialista em Antiguidade, com seu livro "Quando o Nosso Mundo se Tornou Cristão" (Texto & Grafia, Lisboa, 2009).

Veyne tem velha formação marxista. No entanto, intuiu que o imperador Constantino [século 4º] foi o único responsável pela cristianização do Ocidente. Apenas ele, como indivíduo. Sua tese, demonstrada de modo admirável, faz tremer as convicções. Historiadores cristãos ou marxistas veem em Constantino um instrumento de algo muito maior. Veyne, ao contrário, percebe nele uma causa. Não contente, lança-se num ensaio teórico provocador e convincente: "A Ideologia Existe?". Na contracapa do livro, suas teses são dissimuladas para não chocar o leitor. Também no título, que disfarça o pivô individual.

Escreve Veyne: "No total, a cristianização do mundo antigo foi uma revolução desencadeada por um indivíduo, Constantino, cujos motivos eram exclusivamente religiosos. Nada teve de necessário, de inelutável ou de irreversível. O cristianismo começou a se impor a todos porque Constantino, sinceramente convertido, favoreceu-o e o sustentou; e porque essa religião estava eficazmente organizada numa igreja. Constantino converteu-se por razões ignotas e julgou que o cristianismo era digno de ser a religião do trono porque sua superioridade religiosa era evidente aos seus olhos; e que o cristianismo, embora minoritário, tinha se tornado o grande problema religioso do século. Foi só por Constantino que a história universal alterou-se de maneira irreversível...".
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18 de setembro de 2009

processos e padrões de divisão do trabalho no Estado pós-oligárquico


[Jardim de Alá, 1950
José Medeiros.

Pirelli/MASP]

paper a ser apresentado
na reunião da
Anpocs, 2009
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Adriano Codato

Este trabalho ocupa-se da vida interna do Departamento Administrativo do estado de São Paulo entre 1939 e 1945. É um exame dos procedimentos legislativos da agência criada durante o regime do Estado Novo e pretende captar, ao lado das atribuições legais, suas funções reais no sistema estatal.

Através de uma abordagem quantitativa, trata-se de comparar as atribuições e a ampliação das atribuições, tal como definidas nos decretos-lei de criação e modificação dos Departamentos Administrativos, com seu papel efetivo na política ditatorial.

Se a análise da legislação revela as intenções do seu criador e, indiretamente, os motivos da sua criação, precisar seus padrões de funcionamento concreto permite ver como de fato a divisão do trabalho político e burocrático estava organizada e operava no Estado pós-oligárquico e o que isso significava para a distribuição do poder pelas diferentes facções de elite.

As relações entre o processo político, o processo decisório e o reordenamento das facções da elite podem ser explicadas mediante duas noções muito operacionais propostas por Anthony Giddens (“Elites in the British Class Structure”, 1974): “relevância institucional” (de um determinado aparelho entre os aparelhos do Estado) e “hierarquia” (isto é, hierarquia política entre os diferentes grupos de elites que formam o universo político).

Hierarquia entre elites ou entre grupos de elite está diretamente conectada a “poder de agenda”: um grupo político que consegue decidir sobre temas mais importantes submete outro que não tem, mesmo formalmente, o mesmo “poder”, isto é, que não controla o mesmo tipo e o mesmo volume de recursos políticos, burocráticos etc., cujas decisões não têm o mesmo raio de ação, e cujas ações não exercem a mesma influência sobre os demais grupos.

Esse critério objetivo (pois permite medir a capacidade política dos agentes através dos temas de política que chefiam) desloca a classificação do poder relativo das facções da elite da definição formal das competências dos aparelhos que elas controlam (via legislação, por exemplo), ou da situação social /conexão política dos decisores para o âmbito específico do processo decisório.

Por essa idéia existe assim um paralelismo estrito entre a hierarquia da elite (elites nacionais, elites regionais; e, dentro dessa última, alta, média e baixa oligarquia) e a hierarquia dos assuntos governados por ela. Assim, conforme a proposição de Giddens, a ordem de importância sobre o que se decide rege a ordem de importância de quem decide – ou é, ao menos, um índice do seu poder efetivo.

Relevância institucional diz respeito à natureza da instituição que um grupo (político, no caso) comanda e conduz e, mais especificamente, ao valor estratégico dessa instituição para uma dada sociedade (no nosso caso, para uma configuração institucional particular). Sua autoridade, prestígio ou influência (“institutional salience”) pode ser estimada, objetivamente, em função das chances políticas que faculta aos agentes que fazem parte dela.

Para os nossos fins, esse indicador, menos preciso que o primeiro, arrasta a definição e a delimitação da quantidade de poder da posição protocolar que o aparelho ocupa no organograma (ou que uma instituição detém no sistema social, o sentido original da definição) para o terreno do processo político-burocrático.

Por essa idéia, deduz-se, a importância estratégica de uma agência é função ora da dinâmica política mais geral (o que indica que se olhe também para fora do circuito decisório), ora da batalha entre os agentes burocráticos e políticos no interior do circuito decisório por uma série de coisas: pelo poder de definir a própria agenda e a dos demais, pelo poder de decidir ou de adiar uma decisão, impedir sua execução, pelo poder de modificar seu conteúdo no momento da implementação e assim por diante.

Em resumo: instituições importantes e decisões importantes tornam, ipso facto, a elite importante.

As duas variáveis pegadas são decisivas para decidir, de acordo com o raciocínio de A. Giddens, as posições ocupadas pelos diferentes grupos políticos no universo das classes dirigentes.

O que é essencial reter dessa perspectiva analítica é que o estudo das decisões (seus tipos, seu encadeamento, seu escopo, seu âmbito) e o estudo do mecanismo de tomada de decisões (sua ordem, suas regras, seus procedimentos, seus aparatos) são procedimentos estratégicos para descobrir tanto o valor da instituição onde se decide, quanto a autoridade da elite que a pilota.

para ler o paper completo,
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17 de setembro de 2009

Pesquisadores brasileiros são premiados pela produtividade e impacto científico

[Foscarini]


JC e-mail 3848, 15 Set.2009.

A Capes, em parceria com a Divisão Científica da Thomson Reuters, promoverá na quinta-feira, dia 17, em Brasília, a entrega do Prêmio Thomson Reuters de Produtividade e Impacto Científico

Para esta primeira edição, foram escolhidos quatro pesquisadores e uma bibliotecária. O prêmio foi dividido nas categorias Ciência Pura, Ciências Sociais, Artes e Humanidades, Melhor Trabalho de Bibliometria e Cienciometria e bibliotecário, que tenha se destacado na divulgação do Portal de Periódicos e da base Web of Science na sua instituição.

Os vencedores foram escolhidos a partir de uma análise bibliométrica dos artigos mais citados na base Thomson Reuters High Impact Papers em cada uma das áreas do conhecimento selecionadas.

"Com o prêmio, buscou-se reconhecer e chamar a atenção da comunidade científica em geral para o fato de que publicar com qualidade é imperativo, pois assegura a análise e a avaliação do progresso da ciência brasileira", explica José Cláudio Santos, gerente regional da Thomson para América do Sul.

Participarão da solenidade, o presidente da Capes, Jorge Guimarães, o vice-presidente executivo da Thomson Reuters, Keith MacGregor, o diretor de Programas e Bolsas da Capes, Emídio Cantídio de Oliveira Filho, a diretora de Gestão da Capes, Denise Menezes Neddermeyer, reitores e pró-reitores de universidades brasileiras usuárias do Portal de Periódicos e os vencedores do prêmio.

Os vencedores do Prêmio Thomson Reuters de Produtividade e Impacto Científico são:
Categoria Ciências Puras - Jairton Dupont; artigo analisado: "Ionic liquid (molten salt) phase organometallic catalysis", publicado no periódico Chemical Reviews.

Categoria Ciências Sociais - Carlos Augusto Monteiro; artigo analisado: "Is obesity replacing or adding to under-nutrition? Evidence from different social clases in Brazil", publicado no periódico Public Health Nutrition.

Categoria Artes e Humanidades - Peter Henry Fry; artigo analisado: "Politics, nationality, and the meanings of 'race' in Brazil", publicado no periódico Daedalus.

Melhor trabalho de Bibliometria e Cienciometria - Pablo Diniz Batista; artigo analisado: "Is it possible to compare researchers with different scientific interests?", publicado no periódico Scientometrics.

Bibliotecário que se destacou na divulgação da base Web of Science - Jane Rodrigues Guirado.

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16 de setembro de 2009

Paulo Vinicius Coelho: O Morumbi e a Copa

[Spo Foot Soccer.
Life]


Folha de S. Paulo 13 set. 2009


PAULO VINICIUS COELHO

Para entender o caso do estádio, é preciso conhecer o jogo político de governadores e do presidente da CBF


O MORUMBI está na Copa do Mundo de 2014.

Por mais que tenha existido pressão pela construção de uma nova arena, em São Paulo, e que as declarações do secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, levem a pensar o inverso, o risco do Morumbi, hoje, não é ficar fora do Mundial. É perder o jogo de abertura.

Isso está claro há meses e tem a ver, sim, com questões políticas. Se os governadores mais próximos de Ricardo Teixeira, José Roberto Arruda (DF) e Aécio Neves (MG), esforçam-se para viabilizar obras em seus estádios públicos, e se o governador José Serra (SP) não admite usar dinheiro do contribuinte para reformar ou construir estádio, evidentemente há um viés político.

Diga-se, o mais correto dos governadores é Serra, embora este possa se dar ao luxo de não mexer nos cofres públicos, porque o estádio paulista é particular, diferentemente do Mineirão e do Mané Garrincha.

O jogo de governadores é vital para entender o imbróglio do Morumbi. Não foi por acaso que Ricardo Teixeira também disse que sua maior preocupação é com os aeroportos, não com estádios. Digamos que tenha razão quem afirma que São Paulo não tem estádio para abrigar a partida inaugural. Brasília e Belo Horizonte não têm aeroportos.

Para entender o jogo da Copa-14, é fundamental saber qual a função do dinheiro enviado pela Fifa. São US$ 470 milhões, como disse Ricardo Teixeira ao "Arena Sportv", na quarta-feira. Quantia dedicada a obras que não deixarão legado.

Um estádio novo ficará para o futebol brasileiro, seja público ou particular. Um aeroporto reformado permanecerá para uso da população. Um centro de imprensa, não.

Se for preciso, por exemplo, comprar aparelho de raio-X para inspecionar quem entra e sai do centro de imprensa, esse investimento deve ser feito com dinheiro da Fifa. Se um governador apresentar esse tipo de gasto ao Tribunal de Contas, que devolva o dinheiro e cobre de quem administrou os US$ 470 milhões.

"José Serra não põe dinheiro público nem sob tortura", diz um dos membros da candidatura paulista. Isso aumenta a vocação de São Paulo para fazer uma das semifinais, como aconteceu na Alemanha com Dortmund, de estádio que lembra o Morumbi e que abrigou Itália x Alemanha, em 2006. Já pensou Brasil x Argentina numa semifinal, no Morumbi? É melhor essa perspectiva ou o jogo de abertura?

Na quarta, Ricardo Teixeira assinou mais uma vez seu atestado de incompetência ao admitir que, em 20 anos de mandato, não fez o país ter um único estádio capaz de abrigar uma Copa. Seu risco, agora, é deixar como legado estádios que não serão usados pelo futebol brasileiro, depois do apito final de 2014.

No Brasileirão-2015, vale mais um Morumbi digno do que uma Allianz Arena em Cuiabá. Em São Paulo, a Copa parece ser, mais do que em outros lugares, um meio de se atingir um fim, o de ter uma arena de alto nível, para jogos e shows, em 2014, 2015, 2016... Em Brasília, é mais provável ter um estádio para a abertura da Copa. Quando ela acabar, sem times de alto nível, o estádio será usado por equipes que lutam no bloco intermediário da Série B.

Se isso se confirmar, será o fim.
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14 de setembro de 2009

A história social e intelectual do Paraná

[Poloneses no Paraná,
Colônia Thomas Coelho,
1988. João Urban. Pirelli/MASP]

Marcio Oliveira
José Swakzo

Ensaios de sociologia e história intelectual do Paraná. Editora da UFPR, 2009.

A história social e intelectual do Paraná ainda está por ser escrita. Esta obra tem consciência disso.

Para contribuir com o esforço de “contar” essa história, é necessário um esforço amplo e crítico em torno dos termos história intelectual, sociologia do campo intelectual, assim como Paraná, estabelecendo, dentro de um processo de longo prazo, conexões entre tais termos.

O conjunto de ensaios aqui reunidos contribui para pensar as partes dessa equação (história, sociologia intelectual e Paraná) sem, necessariamente, pretender uma síntese entre elas. Olhando para as transformações históricas das estruturas regionais e locais, o objetivo perseguido foi o de pensar a multiplicidade concreta das formas assumidas pela relação entre o Paraná, sua vida intelectual e sua história social.

Em torno desse objetivo, dois pressupostos e uma constatação conduziram à seleção e à organização dos temas.

O primeiro pressuposto diz respeito às concepções tanto de história intelectual quanto de intelectual. Menos que apresentar um compêndio histórico-institucional sobre a atividade intelectual stricto senso no Paraná, restrito aos campos literário e acadêmico, nossa concepção de história intelectual amplia o repertório de objetos que historicamente produziram intelectuais e idéias.

O segundo pressuposto diz respeito à definição de quem são os intelectuais e, além disso, quais produções e conteúdos culturais se caracterizam por serem produções intelectuais. Ao invés de elencar variáveis sociológicas capazes de delinear uma possível intelligentsia paranaense, reconhecemos que qualquer delimitação e definição a priori de 'intelectual' tanto impede quanto dificulta a compreensão da gênese histórica de determinadas representações intelectuais.

Uma última questão guiou a seleção dos ensaios: o Paraná. Afinal, de que Paraná se fala? Seria aquela espécie de região-ponte que servia de passagem entre o “Brasil” e o “sul” ou o estado das silenciosas elites erva-mateiras? Ou ainda aquele da Curitiba planejada e da Londrina pioneira?

Em nosso caso, o todo parece ser menor que as partes que o compõem, o estado sendo muito maior do que aparenta ser. É sobre este Paraná múltiplo que se debruçam os diversos trabalhos reunidos.

É este Paraná diverso que entregamos aos leitores.

Os organizadores

Márcio de Oliveira é professor do Departamento de Ciências Sociais da UFPR. Além de diversos artigos em revistas nacionais e estrangeiras, publicou “Brasília, o mito na trajetória da nação” (Paralelo 15) e “As Ciências Sociais no Paraná” (Contexto).

José Eduardo Léon Swakzo é mestre em Sociologia pela UFPR. Atualmente, é doutorando em Ciências Sociais na UNICAMP.

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13 de setembro de 2009

o ensino de economia (a disciplina) e a crise do capitalismo - II


[Custom-made Havana cigar banded
"Specials for Professor Erhard,"
W. German Economics
Min. 1960. Life]

Folha de S. Paulo 13 set. 2009

Há alternativas, novos temas ou enfoques que devam ser incorporados ao ensino de economia?

Sociedade, instituições e história
LEDA PAULANI

Recentemente, a rainha da Inglaterra visitou a lendária London School of Economics e perguntou aos doutos docentes por que ninguém lograra prever a profundidade da crise que se avizinhava.

Os professores, cultores da teoria ortodoxa, crédulos do mercado e de suas divertidas utopias (autorregulação, eficiência, ótimo social), responderam que, contando embora com as mais brilhantes mentes matemáticas, o cálculo do risco enfocara apenas fatias do mercado. O sistema como um todo não fora considerado.

O que eles não disseram é que, formados na doxa econômica, os economistas jamais conseguiriam fazer esse tipo de análise totalizadora.

A formação hoje dominante põe ênfase apenas na matemática, nas técnicas de modelagem, olhando com enfado quaisquer considerações não passíveis de matematização.

Sociedade, instituições, história não cabem nessa visão, são anticientíficas.

A filosofia também não tem lugar, pois é com fastio igual que se encaram as questões metodológicas.

Economistas heterodoxos se deram conta dessa lacuna na resposta desses professores e lembraram a acusação, feita em 1991, por uma comissão da Associação Americana de Economia, sobre os cursos de pós-graduação em economia, os quais estariam formando "sábios idiotas", treinados na técnica, mas "inocentes" do mundo real.

A crise, porém, não estancará a produção de sabichões. Uma formação que desdenha a mais abrangente e consistente teoria do capital só pode continuar a fazer o que tem feito: vender ideologia como ciência.

LEDA PAULANI é professora titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP e autora de "Brasil Delivery" (ed. Boitempo).
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o ensino de economia (a disciplina) e a crise do capitalismo - I


[TIME cover: Ronald Reagan
Sept. 21, 1981

David Hume Kennerly]


Folha de S. Paulo 13 set. 2009

Há alternativas, novos temas ou enfoques que devam ser incorporados ao ensino de economia?

Repor a razão na história
LUIZ GONZAGA BELLUZZO

Ao longo do século 19, a economia abandonou definitivamente os constrangimentos da política e inventou o Homo oeconomicus.

Dotado de conhecimento perfeito, esse ser, produto da mais absurda abstração, busca maximizar sua utilidade ou os seus ganhos, diante das restrições de recursos que lhe são impostas pela natureza ou pelo estado da técnica.

Os sistemas sociais nascidos desse paradigma dominante em economia não dispõem de uma estrutura intrínseca, isto é, esgotam-se nas propriedades atribuídas aos indivíduos racionais e maximizadores, partículas que definem a natureza da ação utilitarista e que jamais alteram seu comportamento na interação com as outras partículas carregadas de "racionalidade".
Os manuais de economia mais badalados acatam as chamadas teorias novo-clássicas, com expectativas racionais.

Elas afirmam que a estrutura do sistema econômico no futuro já está determinada agora. Isso porque a função de probabilidades que governou a economia no passado tem a mesma distribuição que a governa no presente e a governará no futuro. A historicidade da vida social vaza pelo ralo.

Para os que dissentem dessa visão, a economia é um saber que está obrigado a formular suas hipóteses levando em consideração o tempo histórico, dimensão em que se desen- rola a ação humana.

Ela deve se entregar ao estudo do comportamento dos agentes privados em busca da riqueza, no marco de instituições sociais e políticas construídas pelas ações e decisões coletivas do passado, ou seja, pela história.

LUIZ GONZAGA BELLUZZO é economista e professor aposentado da Unicamp. É autor de "Ensaios Sobre o Capitalismo no Século 20" (ed. Unesp).
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12 de setembro de 2009

capitalismo: uma definição histórica

[Portrait of British banker
Nathan Meyer Rothschild.

October 1817. Life]




adriano codato

Capitalismo é, na linguagem marxiana, um "modo de produção".

Marx caracteriza com isso mais uma sociedade (a sociedade burguesa) do que um sistema econômico específico. Isto é, mais uma forma de organização social (e os seus correlatos: uma política burguesa, uma ideologia burguesa) do que um regime definido por certos indicadores econômicos: taxa de investimento, produção per capita, renda global etc.

O início do capitalismo pode ser situado no século XVI, na Europa ocidental. Sua etapa “clássica” foi a etapa industrial (séculos XVIII e XIX) que sucedeu a mercantil (ou comercial). Ela correspondeu a uma revolução na forma de produzir a partir da introdução da máquina a vapor nas fábricas de tecidos na Inglaterra (primeira Revolução Industrial).

No livro mais conhecido de Marx e Engels, O manifesto do partido comunista (1848), onde a expressão “capitalismo” todavia não consta, pode-se ler uma das mais fascinantes – e desassombradas – descrições desse sistema social.

Através da ação da BURGUESIA, essa classe cujo papel histórico foi revolucionário, ficamos sabendo que o que distingue “a época da burguesia”, ou a época capitalista, “de todas as outras épocas anteriores” é uma disposição particular para “revolucionar constantemente a produção, abalar sem cessar todas as condições sociais” e promover “a incerteza eterna e o movimento eterno”. Nesse regime social, em que todas as antigas instituições feudais foram afogadas “nas águas geladas do cálculo egoísta”, nada dura para sempre. Nesse movimento de transformação contínua, “tudo que é sólido desmancha no ar”.

A inovação – tecnológica, científica – sucessiva é, para Marx, um imperativo do próprio sistema, que se orienta pela acumulação infinita do capital, não resultado da livre-iniciativa.

A característica básica desse modo de produção é, conforme o Dicionário do pensamento marxista (Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988), a propriedade privada do capital (capital esse que pode assumir a forma de terras, dinheiro, máquinas, fábricas) nas mãos de uma classe, a classe dos capitalistas. Hoje, um elemento importante dessa definição, ao lado da propriedade do capital, é o controle sobre o capital (isto é, o poder de decisão sobre os investimentos, por exemplo).

Outras características a serem agregadas a essa definição e que caracterizam o capitalismo são: produção de mercadorias; universalização das trocas e, portanto, estabelecimento das relações sociais através da mediação do dinheiro; força de trabalho (“mão de obra”) assalariada; ausência de controle dos trabalhadores sobre o processo de trabalho. Veja que “lucro” não é um traço definidor desse sistema.

A definição mais sucinta é possivelmente esta: o capitalismo é um regime onde a produção é coletiva e a apropriação (do que é produzido), privada.

Há duas descrições bem ilustrativas do capitalismo industrial no século XIX na tradição marxista. A etnografia de Friedrich Engels sobre a vida dos operários ingleses: A situação da classe trabalhadora na Inglaterra em 1844 (1845) e o capítulo XIII de O capital (1867), de Karl Marx, intitulado “Maquinaria e grande indústria”.
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8 de setembro de 2009

história intelectual do paraná


A gralha azul desbotou?

J. Szwako

A Editora da UFPR acaba de publicar o livro Ensaios de sociologia e história intelectual do Paraná.

Dedicadas a questões como intelectuais, política e cultura paranaense, as seções do livro oferecem um amplo panorama dos projetos políticos e das disputas em torno do Paraná e de sua identidade. Mais que isso, Ensaios oferece uma perspectiva alternatina e crítica à do 'Paraná Tradicional' com suas alegorias míticas tais como a gralha azul ou a araucária.

Aos olhos dessa versão alternativa, esses temas folclóricos e hegemônicos não se desbotam, eles apenas ganham sua devida nuança.

[para comprar, clique na capa]

4 de setembro de 2009

Kind of Blue



[Jazz musician
Miles Davis.
Life]


Leia. E depois ouça no post abaixo.
A história da gravação histórica aqui.



Ivan Lessa

Colunista da BBC Brasil

No dia 17 de agosto eu estava em Cascais, perto de Lisboa. No jornal local, que eu lia devagar como um analfabeto brasileiro, não perdia as efemérides do dia. Férias, falta de pulmão e velhice é assim mesmo. A gente se interessa pelas coisas mais bobas do mundo.

Era-me importante, saber que, nesta ou naquela outra data, um rei, um Manuel ou um Joaquim, fizera ou desfizera isso ou aquilo. Lá estavam também aniversários de atores, escritores, gente de sociedade. Muitos brasileiros também.

No dia 17 de agosto, à beira de uma bela piscina, tendo na cabeça um boné vermelho dos Criadores de Sacis, do interior de São Paulo, fui lembrado de que, naquela data, há precisamente 50 anos, fora lançado no mercado americano pelo selo Columbia o LP Kind of Blue, de Miles Davis, conforme se costuma dizer. Na verdade, Miles estava lá – ora se! – mas com ele seu sexteto, que deve e precisa ser lembrado um por um de seus membros. Bill Evans no piano (revezando em algumas faixas com Winton Kelly), Jimmy Cobb na bateria, Paul Chambers no contrabaixo, John Coltrane e Julian “Cannonball” Adderley no saxofone. Teo Macero e Irving Townsend na produção.

Tudo isso é muito importante saber. Se o distinto está mais para o rock do que para o jazz, problema seu, mas é bom saber. Como é bom saber das origens do rock no rhythm'n'blues e na música caipira lá deles. Toda música boa tem seus marcos divisores. Para uns, Mozart é pelo menos três deles.

Jazz tem, dizem os entendidos, o Kind of Blue como um de seus marcos divisores. Sendo que, além do mais, é tido, por gente boa que impõe respeito, como um dos álbuns mais importantes de todos os tempos em qualquer gênero.

Na verdade, eu não sou tão amante do jazz assim quanto dizem. Quem “dizem”? O Carlinhos, o Zeca Passos e a Glória Castanheira. Eu prefiro gente cantando. Feito a Chris Connor, que subiu agorinha mesmo, dia 29 de agosto, aos 81 anos de idade.

Vozes. Eu ouço, eu amo ouvir, vozes. Eu quero as letras. Decorar e cantarolar mentalmente. Ah, vocês não sabem a extensão de meu repertório! Que conjunto vocal faço comigo mesmo – mais avançado mesmo que os Modernaires, os Hi-Lo's e os Four Freshmen. Em compensação, sou incapaz de captar no ouvido interior o, digamos, Take Five, do Dave Brubeck, partindo para um lugar-comum do jazz.

Minhas vozes vão de samba, bolero, fox, não perdoa até mesmo chanson francesa. Mas sou forçado a admitir: a reputação do disco do sexteto me fez comprá-lo em 1989 quando do 30º aniversário de sua gravação. Que, por falar nisso, foi registrada em duas “sessões” nos estúdios da Columbia Records, no rua 30, Nova York, em 2 de Março e, depois, em 22 de abril. Mas eu já li algures (alguém aí leu “Algures”? Bons sonetos) que foi numa igreja desconsagrada.

Vai ver foi os dois. A tal da igreja virou estúdio, e o estúdio virou igreja dedicada ao que também é chamado um dos dez discos mais importantes da música. Popular, erudita, clássica, sagrada, qualquer uma. Por falar em sagrada, muitos garantem que além das óbvias - e poderiam deixar de ser óbvias? - influências de Debussy e Eric Satie, pode-se ouvir, prestando muita atenção, um certo je ne sais quoi dos cantos gregorianos em algumas faixas.

Eu resumo dizendo o seguinte. Logo que cheguei a Londres, botei no aparelho de som o CD. Li o erudito livrinho que vinha anexado na edição dos 30 anos que eu tinha. Observações moduladíssimas de Bill Evans, inclusive.

Descobri na amiga Anete (é Net, uai!) uma porção de artigos eruditos. Quase chego a entender o que seja aquilo que me garantem ser a alma da gravação: o famoso modal, ou modalismo, para nós, agora com a reforma ortográfica. Modalismo: um sistema musical que utiliza modos. Isto é, escalas, fórmulas, ritmos. Uma volta à melodia, disse Miles em entrevista. E comprei pela Amazon o mais recente livro que comemora a cinquentenária gravação: The Blue Moment: Miles Davis' Kind of Blue and the Remaking of Modern Music, de autoria de Richard Williams, que é danado de bom e conheço de outros Carnavais, editado pela Faber, tem 309 páginas e custa quase 30 dólares.

Quincy Jones que sabe das coisas, para não dizer que sabe de tudo, em matéria de qualquer tipo de música, disse que o Kind of Blue é feito suco de laranja: ele tem que tomar, no caso ouvir, todo dia. E vamos de ecletismo: o rapper Q-Tip endossou a importância do álbum quando disse que o disco é feito a Bíblia, há que se ter um exemplar em todas as casas. Roberto Carlos disse que… Não, não sei o que o Rei disse, não sei se o Rei sequer o ouviu. Esperemos que sim.

Sei que vou ler o que aparecer a respeito na minha frente. Vou ler e ouvir. Ouvir e ler. Música boa é assim. Tudo que é bom, que vale a pena, é assim. Dá trabalho. Não é só cantar o Hino Nacional, feito a Vanusa (vide YouTube), ou dizer “Interessa?”, como o Ivon Curi naquela velha chanchada da Atlântida.
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miles