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17 de fevereiro de 2010

a mídia, os intelectuais e Pierre Bourdieu

[Série A Várzea do Carmo, 1979-1980
São Paulo, SP. Raul Garcez.
Pirelli/MASP]

Jacques Bouveresse
do Collège de France.

Cada dia que passa temos mais uma oportunidade de observar o enorme vazio criado pela morte de Pierre Bourdieu e de constatar o quanto se tornou arcaico o modelo do intelectual crítico, do qual provavelmente ele terá sido o último grande representante na França. A meu ver, o que está substituindo esse modelo foi muito bem descrito por Jean-Claude Milner, quando escreveu em seu panfleto Existe-t-il une vie intellectuelle en France ? (Existe uma vida intelectual na França?): “À primeira exortação a servir, sucedeu a segunda: ‘deixem de nos ofuscar com inúmeras provas de um saber excessivo ou de uma lucidez desagradável’, acrescentaram os notáveis. Não basta servir, é preciso também se mostrar humilde. Existiram retóricos para formar os doutrinários dessa humildade do Collège de France à imprensa. Daí o intelectual de hoje, pusilânime diante dos fortes, duro diante dos fracos, ambicioso sem projeto, ignorante sob os ouropéis do pedantismo, impreciso de estilo minucioso, inexato de estilo detalhista” 1 .

Mesmo que, como acontece quase sempre nesse caso, provavelmente Milner tenha tendência a idealizar um pouco o período anterior, o que diz parece basicamente certo e corresponde à chegada ao poder de um tipo de intelectual de quem Bourdieu conhecia particularmente bem os costumes e o comportamento, e de quem ele pressentiu e descreveu o advento. Há pouco tempo, propus denominar “intelectual deferente” o tipo de intelectual que evita cuidadosamente dar a impressão de saber mais ou de ter mais consciência que outros e que não perde a oportunidade de manifestar seu respeito por todas as formas de poder, econômicas, políticas e midiáticas, pelas autoridades morais e religiosas, pelas crenças populares e até, se for o caso, pelas idéias feitas.

A evolução, no período atual, constitui uma das questões sobre as quais sempre tive oportunidade de conversar com Bourdieu nos últimos anos. E é importante salientar que ele faz parte justamente daqueles que se opuseram até o fim à idéia de praticar a humildade sob a forma falaciosa que é recomendada atualmente, em outras palavras, à idéia de fazer concessões e de aceitar o acomodamento demandado em relação à competência e ao saber, com a esperança de conseguir contentar o maior número possível de pessoas. Ele jamais considerou que a tarefa do intelectual, mesmo e sobretudo a do sociólogo, pudesse ser, como se demanda cada vez mais, hoje, de se limitar a simplesmente retratar o social sob todos seus aspectos, inclusive os mais inaceitáveis, evitando o máximo possível julgá-lo e formular apreciações suscetíveis de chocar ou de ofender os atores.

Para Bourdieu, a tarefa do sociólogo jamais consistiu, de acordo com uma expressão utilizada pelo orientador da tese de Elisabeth Teissier, em se ocupar essencialmente de “aspirar o social”, inclusive, eventualmente, no que ele pode ter de mais nauseabundo para alguém que conservou determinadas exigências morais e intelectuais, mas em adquirir um conhecimento real dos mecanismos que o governam, por meio de métodos que nada têm de natural e de imediato, um conhecimento que não só é desejável, mas indispensável, para se conseguir ter êxito em transformá-lo.

Esse aspecto do problema é fundamental para se compreender alguns dos mais virulentos ataques enfrentados por Bourdieu nos últimos anos de sua vida. Ele se achava em uma posição de alguém que dá a impressão de defender uma posição cientificista e elitista contra o que se pode chamar a democracia e a igualdade em matéria de conhecimento e de crença. Este é o modelo do intelectual deferente adotado por Philippe Sollers quando, em um artigo intitulado “Pelo pluralismo midiático”, publicado no dia 18 de setembro de 1998 no Le Monde, caracteriza nossa época como “uma época de pluralidades, incertezas, caras sempre novas, surpresas, interseções, confrontos, singularidades irredutíveis”, e recomenda ao intelectual aceitar a partir de então, tratando em pé de igualdade todas as formas de contradição e de debate, qualquer que seja sua origem e seu grau de competência e seriedade, aqueles que expressam um ponto de vista diferente do seu.


leia a continuação do artigo aqui

(Trad.: Wanda Caldeira Brant)

1 - Jean-Claude Milner, Existe-t-il une vie intellectuelle en France? Editions Verdier, Lagrasse, 2002, p. 24. 
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